Um dos campos privilegiados de observação empírica para desenvolver programas de abertura e aprofundamento das teorias sociais são as catástrofes ou acidentes, quando a natureza humana, inatamente biológica mas também socialmente incorporada, se revela de forma mais evidente. Tanto a nível micro como macro, nas práticas e nas culturas, nas disposições latentes e manifestas. Lá onde menos a sociologia tem chegado, onde a instabilidade domina e a sociedade se revela.
Lá onde cada vez mais, por efeito da globalização experimentalista, das mudanças climáticas, das transformações demográficas, ou da reformulação política das instituições, o caos parece instalar-se nas práticas. E também nas dificuldades das ciências rotinadas em abordarem teórica e metodologicamente tais cenários. Pode falar-se do terrorismo em Nova York, da ruptura dos diques de proteção em Nova Orleans, da luta política em África, no Iraque, no Afeganistão ou no Kosovo, da guerra das estradas, dos novos pobres na União Europeia, nas redes globais de tráfico humano e nas redes de tortura sem fronteiras, e muitos outros assuntos, desde a imigração até à emergência, virtual ou atual, de movimentos de massas.
As ciências de emergência têm origem em várias tradições disciplinares e estão preparadas para participarem em formas cooperativas de ataque científico a fenômenos do género dos acabados de mencionar. Bem como a outros, como seja a formação e acompanhamento dos quadros de saúde preparados para interagir com os doentes no meio social onde estes vivem, em vez de os obrigarem a deslocar a (e de os isolar nos) hospitais. Ou a formação e acompanhamento dos quadros de ajuda ao desenvolvimento, ou de ajuda humanitária, de quem se espera mais eficácia na ação, menos desigualdade entre cooperantes e autóctones, menos dependência Norte-Sul. Este tipo de emergências são, ao mesmo tempo, o que surge e o que urge, o que se atualiza e tende a perder atualidade, seja por via de processos de normalização seja por via de processos de segregação (recalcamento, segredo, repressão).
A sociologia da instabilidade será tanto mais eficaz quanto melhor for capaz de responder às solicitações e necessidades de observação e intervenção em emergência. Será uma sociologia despojada de pretensões de tudo compreender ou explicar, aberta às contribuições de outras ciências, seja como inspiradoras de novos modos de observar as sociedades seja como contribuições especializadas sobre como entender realidades extra sociais. Será o contributo da sociologia para as ciências de emergência.
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